30 de outubro de 2009

Algoritmo para chorar

Meu amigo,

Ontem chorei. Chorei como há muito não chorava. E não me pergunte por que chorei. Não sei aonde dóia. Apenas doía.

Fazia muito tempo que eu não derramava nenhuma lágrima, e aí talvez a angústia fosse mesmo pelo desespero de saber se eu tinha esquecido como fazer.

Apertar os olhos, comprimir o peito, soluçar um pouco, nada muito embaraçoso, nada que chamasse muito a atenção... Eu tinha o algoritmo perfeito. Só não conseguia executá-lo. E tentei algumas vezes nos últimos tempos. Mas não houve beijo de novela, velório, briga com amigo, nada que desencadeasse a reação.

Queria apenas umas lagrimazinhas escorrendo no rosto. A quenturinha reconfortante, o gosto de sal na boca. Não precisava nem de platéia. Não precisava nem de consolo. Eu queria só lembrar como era. Mas, talvez isso fosse só uma desculpa que inventei pra poder chorar e dizer que não tinha motivo nenhum pra isso.

Não havia razão para dor. Mas nem sempre as dores tem razão. Muitas vezes são irracionais mesmo. Meio bestificadas. Dúvidas sim, havia muitas. Mas quem precisa chorar por dúvidas? Para dúvidas se procuram respostas, não se pede para chorar.

E agora, além de tudo, acabo querendo me dizer pelo que se chora ou não.

Tem dias que é apenas a dor que se sente. Uma dor doída e sem razão. A gente nem sabe aonde dói. A gente não sabe de onde veio, se de fora, de dentro, do mundo ou de nós.
E dor desconhecida é a pior dor do mundo. Porque vira uma dor sem remédio. Para ela, não há palavra, não há carinho, não há consolo. Não se sabe o que combater, não se sabe como exterminar.

Uma dor que dói por se saber dor.

E tinha isso tudo preso na garganta, doendo mais por não conseguir chorar.

E aí veio a primeira lágrima, a segunda, e as outras vieram seguindo fácil. Como se estivessem ali apenas esperando por isso. Um choro feliz. O primeiro choro feliz da minha vida.

Um choro de quem acaba de descobrir que não esqueceu como é ser humano.


Saudades grandes de você.

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