30 de outubro de 2009

Entretantas, eu

No meio de uma conversa despretensiosa, acabei descobrindo o quanto não sei de mim.
E o quanto sei e não mostro a ninguém...


No meio de tudo, de toda gente, de toda forma de auto- e desconhecimento,

acabo sendo metade incompleta, o avesso de tudo,
uma parte desencontrada, carta perdida do baralho,
ou separada,
ou aleatoriamente recolocada.


Eu não sei quase nada de mim.


O que importa é, que entre o pouco mais de seis bilhões de seres humanos,
eu sou mais uma, fazendo um pouco de diferença na vida de alguns (muito) poucos.

Estou amando, porque uma vida sem amor não pode ser vida.
"E ando a amar assim, a toda gente, perdidamente"
Estou escrevendo, porque eu sem escrever não sou eu.
Estou biomedicando, porque meu cientificismo ainda é o meu lado mais à amostra.


São minhas pequenas certezas.

Mas, o que me falta?
Descobrir todos os outros lados,
as outras poses,
as outras faces que tenho,
que talvez até você veja melhor que eu.

Tentando apenas ser
No meio de tantos desencontros,
tantos rostos, tantas formas,
tantos mundos, tantas gentes,

Entretantas,
Eu.

Essa parte indefinida que vai metamorfoseando pela vida.

Algoritmo para chorar

Meu amigo,

Ontem chorei. Chorei como há muito não chorava. E não me pergunte por que chorei. Não sei aonde dóia. Apenas doía.

Fazia muito tempo que eu não derramava nenhuma lágrima, e aí talvez a angústia fosse mesmo pelo desespero de saber se eu tinha esquecido como fazer.

Apertar os olhos, comprimir o peito, soluçar um pouco, nada muito embaraçoso, nada que chamasse muito a atenção... Eu tinha o algoritmo perfeito. Só não conseguia executá-lo. E tentei algumas vezes nos últimos tempos. Mas não houve beijo de novela, velório, briga com amigo, nada que desencadeasse a reação.

Queria apenas umas lagrimazinhas escorrendo no rosto. A quenturinha reconfortante, o gosto de sal na boca. Não precisava nem de platéia. Não precisava nem de consolo. Eu queria só lembrar como era. Mas, talvez isso fosse só uma desculpa que inventei pra poder chorar e dizer que não tinha motivo nenhum pra isso.

Não havia razão para dor. Mas nem sempre as dores tem razão. Muitas vezes são irracionais mesmo. Meio bestificadas. Dúvidas sim, havia muitas. Mas quem precisa chorar por dúvidas? Para dúvidas se procuram respostas, não se pede para chorar.

E agora, além de tudo, acabo querendo me dizer pelo que se chora ou não.

Tem dias que é apenas a dor que se sente. Uma dor doída e sem razão. A gente nem sabe aonde dói. A gente não sabe de onde veio, se de fora, de dentro, do mundo ou de nós.
E dor desconhecida é a pior dor do mundo. Porque vira uma dor sem remédio. Para ela, não há palavra, não há carinho, não há consolo. Não se sabe o que combater, não se sabe como exterminar.

Uma dor que dói por se saber dor.

E tinha isso tudo preso na garganta, doendo mais por não conseguir chorar.

E aí veio a primeira lágrima, a segunda, e as outras vieram seguindo fácil. Como se estivessem ali apenas esperando por isso. Um choro feliz. O primeiro choro feliz da minha vida.

Um choro de quem acaba de descobrir que não esqueceu como é ser humano.


Saudades grandes de você.

28 de outubro de 2009

Envelhecer

- Amélie... Como é envelhecer??? Comecei a imaginar como vou ficar daqui a uns anos...

_ Flor, vai ser ao mesmo tempo tudo igual e tudo diferente.

- Adoro quando você me explica as coisas sem me explicar nada...

_Bem simples: você vai ser a mesma essência, mas sua cabeça vai ter o acúmulo da experiência de mais alguns anos que agora. Sua alma vai ter a mesma disposição, a mesma vontade de viver... Mas seu corpo não vai mais acompanhar o ritmo do seu espírito, mais cedo ou mais tarde.

E isso pode doer um pouco... Mas um espírito jovem é o que vai manter a vontade de levantar pra ver o sol todos os dias, mesmo que você nem precise mais levantar tão cedo como agora.
Todos os seres humanos vão ser iguais, terão os mesmo sonhos, as mesmas buscas. O mundo ainda vai continuar evoluindo. Novas invenções. Novos passeios pelo espaço. Mas seremos todos diferentes do que somos agora. Nossos bisnetos vão nos achar tão antiquados quanto achamos retrógada a década de 40. Algumas coisas vão voltar, algumas vão ser novidade, algumas vão embora para nunca mais. Algumas vão virar piada mesmo.

Enfim, minha flor. Tudo igual e tudo diferente.

Só tem um problema sério em envelhecer. Chegar lá sem ainda ter visto a vida.

Então pare de pensar como vai ser amanhã, e comece a fazer coisas hoje para ter do que lembrar mais tarde.
Porque quando todos os seus músculos, ossos, olhos e articulações falharem, são as suas recordações de agora que vão fazer suas tardes valerem a pena.


Parce que la vie nous prenons le cas que nous avons à raconter.

Querência

Era fim de tarde já. A luz do céu naquela misturinha de azul e carmim, parecendo que Deus tava preparando a tinta da aquarela, misturando as cores, misturando os tons.
E era Tom Jobim cantando naquele elepê que nunca cansava de girar... e ela realmente não estava vendo o tempo passar. Perdeu a noção das horas. Perdeu a razão das coisas.

Apenas sentou naquela poltrona onde antes havia sentando seu pai, e antes seu avô. Sentada olhou para fora, pela janela, e viu a vida, viu a tela. Viu de onde veio e até onde chegou.

Esqueceu das horas. O dia virou noite. A noite virou dia. A menina virou moça. A moça virou mulher. Mas a mulher ainda era menina. A menina que às vezes queria chorar. Queria voltar pra casa. Queria o colo da mãe. Queria as rodinhas da bicicleta, para garantir que ela não ia cair.

Mas não lhe deram rodinhas de bicicleta.

E quando ela percebeu que não mais as teria; que tem coisas que simplesmente não podem ser nossas, porque não devem ser nossas. E que sem essas, a gente tem que só levantar e seguir a vida. Sem rodinhas. Porque não dá pra simplesmente largar a bicicleta. Não depois de já ter andado até aqui.

E quando se deu conta da falta de rodinhas ela fechou os olhos e voltou a ouvir Jobim. O disco que não parava de tocar. E a poesia perfeita, a rima perfeita... o dueto com Chico foi tomando conta de tudo, entrando por cada fresta, por cada poro, e a métrica foi entrando em compasso com a respiração. E era tudo uma coisa só: sentimento e melodia. Construção indissociável. A mais nova composição de Jobim. Que nunca veio a ser divulgada.

Era Copacabana, o sabor da paixão, o café em Ipanema, um raio de sol tocando a pele, o piano levando as águas de março... Tudo dentro da moça bordada de flor, do bolero, dos anos dourados... Retratado na fotografia, nos versos banais, nas afobações. Em juras nunca ditas, confissões declaradas no gravador de fita cassete.

Um fim de semana, um chopp gelado, andar pela praia até o Leblon... Cantar a vida, anotando cada acorde num rascunho bem limpo, pra mais tarde escrever uma canção...
Uma canção falando de amor, de sede de vida, de saudade do mar, de bossa nova.



Quando ela acordou, a vitrola ligada já não cantava nenhuma nota. O céu não era mais mistura de aquarela. Não havia mais calçadão, nem piano, nem o silêncio da poesia que não precisa ser declamada. Era a mesma vida de antes. A mesma rotina metodicamente controlada. A mesma mesmice insossa.

Então ela começou a sussurar uma canção baixinho. Não sentia mais falta das rodinhas. Ela descobriu. Não sei o que ela encontrou em seu sonho de bossa nova. Mas seja lá o que foi, colocou um sorriso no rosto dela, e um raio de sol em seus cabelos.

E, a partir de então, todo dia era como aquela manhã caminhando até o Leblon. Sentir a vida entrando em você como a luz do sol ficando mais forte, mais descabida, desinibida.

Um querência sem fim de ser feliz.

Os malefícios da leitura

Hoje vim fazer uma denúncia à comunidade. Uma coisa que acho que muita gente nem percebeu, e quem percebeu achou melhor nem divulgar...

Parem de ler! Parem de ler imediatamente!


A leitura pode trazer consequências irremediáveis ao seu desenvolvimento e relacionalmento psico-social.

Criançinhas que lêem são as primeiras - e talvez as mais afetadas vítimas. Com a leitura, acabam se tornando adultos inconformados, revolucionários. Dados revelam que noventa e nove por cento dos leitores infantis, ao crescerem, acreditam realmente que o mundo devia ser diferente. E pior: Dentre estes, 60% acreditam que podem mudar o mundo. A leitura gera seres incontrolados. Com uma consciência de seus poderes ilimitada. Uma liberdade excessiva. Assustadora. Seres perigosos.

A leitura gera inconformados. Que vêem uma realidade que foi tão ardilosamente mantida escondida por trabalho de tantos durante milênios...

Gera pessoas com síndrome do pânico. Pânico do mundo medíocre. Ordinário. Mesquinho.

A leitura gera mocinhas que acreditam que existe príncipe encantado e cavalo branco. Mulheres que vão viver uma vida em busca de um amor perfeito. Esperando nas janelas, com seus livros em punho, pela serenata que nunca vai chegar. Sonhando com noites de baile, pedidos de casamento, vestidos com saias rodadas, torres de castelo, maça envenenada e sapo que vira princípe. [Minha filha só vai ler Machado de Assis depois dos dezessete, quando já tiver descoberto que tipo de homem anda por esta Terra...]

A leitura leva ao sonho, a fantasia, a devaneios irreprodutíveis em nossa mundo real e concreto. Portanto geradores de frustações. Em casos graves, a leitura leva ao suicídio. Se não do corpo, da alma.

Venho rogar pelo banimento deste mal da humanidade.

A leitura afasta as pessoas da sociedade. A leitura torna suas vítimas incapazes de suportar um mundo insosso, desenxabido. A leitura crônica tende a levar seus dependentes ao isolamento. Medo da incompreensão. E ao medo da solidão. Um paradoxo insolúvel.

A leitura é obscena. A leitura revela íntimos, expõe ao mundo universos particulares. A leitura é a devassidão da sociedade. Onde todos nos tornamos únicos. Identificamos nossas histórias. Nos auto-retratamos e auto-reconhecemos nos outros. A leitura deve ser imediatamente combatida.

Num mundo sem leitura, sem livros, sem histórias, morreríamos felizes na nossa ignorância. Não perceberíamos os grilhões que nos prendem. A falta de luz à qual nos submetem (premedidatamente para ainda mais piorar as condições de acesso às letras). Teríamos dias rotineiros, atolados em trabalhos habituais. A força de produção seria muito maior. O mundo capitalista estaria longe de uma crise. Estaríamos no auge da produção de capital, pois seríamos só nossa cegueira estúpida, jamais influenciada por pensamentos. Para que pensamentos? Para que gastar o tempo com possibilidades?
Jamais conheceríamos o limite das nossas possibilidades, e então jamais nos frustaríamos por não tê-lo atingido. Jamais conheceríamos o limite do prazer, da loucura, da insanidade. Seríamos mais saudáveis. Provavelmente nossa expectativa de vida aumentaria enormenente. Exemplo seja dado dos escritores românticos nacionais. Todos sofreram de mal do século. Todos mortos na flor da juventude. O que todos tinham em comum? Os livros, as letras, o direito iluminador e um amor platônico - decorrente de leituras de amores platônicos.

A leitura, meus caros, gera a loucura. Que o diga Dom Quixote e seus moinhos de vento.

Confisquem os livros. Fechem as editoras. Fechem as livrarias. Impeçam as cafeterias de permitirem leituras acompanhadas de capuccino nos fins de tarde - uma mistura também comprovadamente fatal para as relações humanas.
Impeçam a entrega de livros nas escolas. Proibam os pais de lerem livros para seus filhos dormirem. Não criem monstros. Não desenvolvam em seus filhos um gosto censurável pela comédia, pelo drama, pela fantasia, pelo irreal. Não estimulem a criatividade, a curiosidade. Não criem uma geração de incorformados.

Novas fogueiras de inquisição em praça pública! Para queimar os livros, todos eles. Esses mecanismos geradores de sonhos, de iluminação, de políticos que combatem a corrupção, de seres humanos socialmente comprometidos. Geradores de revolução!
O mais grave crime da leitura é pura e simplesmente gerar seres humanos.


Venho então avisar a todos. Como o mal ainda não está dissemidado, sendo praticado por tão poucos, os malefícios ainda estão sendo suprimidos por todas as convenções trazidas pela novelas das nove, pelos RPGs e pelas promoções de minutos ilimitados nos celulares. Mas isso não vai durar muito tempo.
A leitura é um mal de disseminação lenta, mas potencialmente crônico. Uma vez infectado, o indivíduo portador desenvolve sintomas da inconformação pelo resto da vida. E não há cura. Não há tratamento.

Fechem os blogs, confisquem as datilográficas e os computadores. Fechem os jornais, as prensas. Os cartunistas devem ser detidos, junto com os romancistas, os cordelistas, os colunistas...

Salvem o mundo que conhecemos.

PS.: Podem deixar abertos os twitters, as revistas de celebridades, disseminem a programação da TV aberta "de qualidade". Esses não oferecem risco algum à sociedade.
Fico feliz em ver os conformados em ler 140 caracteres escritos por desconhecidos sobre suas atividades diárias. Updates, flashes a todo momento sobre como foi legal ir ao shopping, ou o que o indivíduo acabou de almoçar... Inutilidade em tempo real. Isso realmente não pode causar nenhuma forma de revolução mundial. Ao contrário. Faz o serviço de "ignoratização", colaborando a nosso favor.
O mesmo para quando informamos a população sobre o que está havendo na Ilha num sei das quantas, onde todos os popstars estão reunidos para um chá de fim de tarde... (chá???)
A TV é um caso a parte. Não é só porcaria que encontramos, então bom prestar atenção na classificação indicativa.

Seguindo

Às vezes a gente nem percebe.

Quando vê já está mudando o foco.

Quando percebe já está olhando para o outro lado. E muda o rumo mesmo. Muda a opinião, o conceito, a visão.

Mesmo quando a gente nem planejou, nem mirabolou, nem nada...

A gente só seguiu o fluxo das coisas, e veja só aonde a gente foi parar.



É fato meus caros: O universo tende ao caos.

26 de outubro de 2009

Minha vontade

Minha vontade tem nome.
Nome e sobrenome.
Minha vontade tem os olhos mais castanhos que eu conheço. E as idéias mais loucas.
Tem um sorriso esperto, de quem sabe da vida... Uma vontade engraçada. Minha vontade me dá vontade de rir sem parar (por mais redundante que isso possa parecer).

Minha vontade tem todas as impossibilidades que podem existir. Minha vontade carrega consigo todos os não, todos os nunca, todos os talvez, todos os ais, os quase e os senão.

Minha vontade é louca desvairada.
Tem hora que fala mansinho... Tem hora que grita pro mundo. Minha vontade é no mínimo inconstante. E me faz bem nunca ser a mesma coisa.

Vontade de louco é assim mesmo.
Sai louca também.

Minha vontade gosta de me tirar o sono. Minha vontade gosta de se mostrar todos os dias. De me lembrar onde ela está. E de como não está. Minha vontade é uma miragem de deserto a me torturar.

Minha vontade nem é minha. Nem vai ser.
Mas se a gente não vive de vontade, de que é que a gente vai viver???

Arrufos

Menininha triste com olhar de infinito,
se eu pedir desculpa,
se eu pedir perdão,
você perdoa eu???
Você vem pra mim???

Perdoa eu, vá... perdoa o menininho...
Diz que perdoa, me dá um sorriso,
me faz um carinho.
Perdoa eu, vá... Perdoa eu...


Menininho bandoleiro,
digo não, perdoo não.
Porque eu digo que perdoo, e aí vem você e faz tudo de novo...
Diz que ama e é tudo ilusão.
Não sei o que você quer,
se tu vem ou se tu vai,
o que tu queres da vida...
Menino mau, sem coração
Maltrata e pede perdão, maltrata e pede perdão...

Perdoo não, menininho bandoleiro,
Perdoo não, que se eu te perdoo,
vem você e tenta de novo.
E da próxima vez eu te acredito mais não.



Menininha triste com olhar de infinito,
daqueles que cabem o sol, lua, estrelas e mais um monte de mundo
Menininha dos olhos de esquecer nunca mais,
então pode ter uma próxima vez???
Então ainda há esperança, menininha que gosto tanto?
Posso tentar de novo?

Posso tentar de novo, minha flor?
Saudade das tuas complicações,
saudade do teu cheiro,
saudade de tu, meu desejo... saudade de tu...
Se tu me quiser, se a gente puder
a gente arruma uns trocados,
a gente vai ver o mundo
Esquece de tudo, dos quase e dos senão...

Se tu deixar, menininha, eu juro que faço mais não...


Menininho bandoleiro,
do sorriso que não sei esquecer.
Sou eu que juro que ainda vou arrumar um jeito
de deixar de te querer...
De deixar de sentir saudade...
Arrumo um jeito de te esquecer.
Vou embora desse mundo, te deixo aqui só,
sem olhar de infinito e sem nada.


Faz isso não menininha,
faz isso não, meu querer bem...
Se você for que vai ser de eu?

Promete que volta, promete que cura
esse medo do escuro, esse medo do sozinho
esse medo de ficar sem tu
essa febre de noite, essa febre de dia...

Aperta o peito, aperta a boca,
dói o coração, sangrando mansinho
saudade de tu, menininha...
saudade de tu.

Sem tu eu fico sem rumo
fico sem prumo
sem eira nem beira
caminhando contra o vento, sem lenço, sem documento...


Perdoa eu, vá...
só um pouquinho, só um beirinha, um tiquim, de ladim...

Importa se for muito ou pouco não...
Sem tu é que não dá pra ficar.

24 de outubro de 2009

Causas

Não é falta de criatividade.
Não é falta de inspiração.
Não é falta de temática.

Não é preguiça literária.

É apenas um não saber o que dizer.

E esse silêncio vai incomodando por toda parte.

13 de outubro de 2009

Chorar

Amélie???

Você está aí?

[silêncio]




Justamente hoje que eu queria te contar... Justamente hoje você inventa de sumir.

Eu ia te contar, Amélie...

Contar que esqueci como é chorar.
Não que eu não queira, Amélie. Apenas não sei como.
Choro por dentro e não choro por fora. E fico juntando toda essaágua com sal que não tem por onde sair.

Ando com medo de me afogar. E ainda acabar a vida com esse gosto de sal.

A lágrima bem que podia ter gosto de chocolate...

Sobre a lembrança e o esquecimento

Como separar de uma caixa de guardados.

O que lembrar e o que esquecer. O que guardar e o que jogar ao vento.
Deixe-me esquecer. Lembrar dia após dia de esquecer das mágoas, dos quase, dos se não. Das frases inacabadas. Esquecer as despedidas quando só há vontade de ficar. Esquecer minhas incapacidades. Esquecer que não posso tudo. Esquecer que não sei cantar, que não sei nadar, que não sei voar, que não sei amar...
Esquecer o que não foi mas devia ter sido. O que seria perfeito. E não passa de um quase.
Esquecer que não sei esquecer. Esquecer que dói quando a gente lembra do que quer esquecer.

Um esforço quase desumano para esquecer da vontade de lembrar.

Não me permitir esquecer dos sorrisos. Das pequenas alegrias. Do gosto de chuva, de marrom-glacê e tarde sentada na grama ouvindo canções que ninguém mais ouve, que ninguém mais gosta.

Não me permitir esquecer das amizades, dos aprendizados, das lágrimas. Das histórias. Dos passados. Do quanto cresci. Lembrar todos os dias de quanto ainda falta de caminho, de carinho, de sentimento. De quanto ainda há para aprender. De tudo que há para ver. E mudar. E transformar.
De tudo que ainda me falta fazer. Lembrar todos os dias de viver. De viver tudo, sentir tudo, ser tudo. Lembrar de ser eu mesma. Lembrar-me dos meus sonhos. Do gosto do chocolate, do gosto da menta, do gosto da vida. Do gosto de ser feliz.

Lembranças para não esquecer.
Esquecimentos por não querer lembrar.

De forma alguma, não devo esquecer de sempre ver o mundo sempre como se fosse a primeira vez.
Amanhecer todos os dias como se fosse o primeiro. E o último.

E de assim separar a minha caixa de guardados, reciclando a minha vida. Cuidando de tudo que há dentro de mim.

E quando parecer tarde, e quando eu tiver medo, e quando eu quiser colo,
Quando que não souber o que fazer, quando eu não souber se valeu a pena...

Eu apenas escolho entre lembrar ou esquecer.

10 de outubro de 2009

Amanheça brilhando mais forte!

Hoje venho a este blog quebrando o protocolo de não torná-lo um diário da minha vida privada.
Hoje vim sim contar as coisas mais lindas que me aconteceram neste fim de semana.

Um fim de semana mágico. Teatro Mágico.

A mágica começou quando segurei o ingresso na mão. O desespero, a angústia, a ansiedade. O medo de perder a entrada no palco.
Eram nove e meia. O show marcado para as nove. Eu na porta do Teatro Guararapes esperando minha heroína vencer o congestionamento da entrada do Centro de Convenções.
Era medo mesmo que havia em meus olhos. Um quase pavor. Ou um pavor e meio.
E lá está ela. E lá está ele. Criador e criatura.

"À margem de toda candura.
Cria a dor, cria e atura"

Ao segurar o ingresso, ao ver escrito naquele pedaço de papel meu lugar naquele espetáculo, me senti como escrevendo meu nome no infinito. No infinito de magia que estava por começar.
Entrar no teatro. Lotado.

Entrada para raros. Música rara em liquidação. 2º Ato.

O show começou. E a sensação começou. Quando você se encontra com você mesmo. Quando é capaz de olhar para o espelho e ver quem realmente é.

Eu sinto que sou um tanto bem maior.

A mágica do circo. A mágica das rimas. A mágica das letras. A mágica de Gabriela. Como não falar em Gabriela? Tecendo sonhos em tinturas, em faixas, em laços, em alturas?
Gabriela nas alturas do balanço enquanto Fernando nos fazia subir ainda mais alto. Chegar a tocar o céu sem sair do chão.

A poesia prevalece!!!
O primeiro senso é a fuga.
Bom...
Na verdade é o medo.
Daí então a fuga.
Evoca-se na sombra uma inquietude
uma alteridade disfarçada...
Inquilina de todos nossos riscos...
A juventude plena e sem planos... se esvai
O parto ocorre. Parto-me.
Aborto certas convicções.
Abordo demônios e manias
Flagelo-me
Exponho cicatrizes
E acordo os meus, com muito mais cuidado.
Muito mais atenção!
E a tensão que parecia não passar,
“O ser vil que passou pra servir...
Pra discernir...”
Pra pontuar o tom.
Movimento, som
Toda terra que devo doar!
Todo voto que devo parir
Não dever ao devir
Não deixar escoar a dor!
Nunca deixar de ouvir...

com outros olhos!

Reencontros. Comigo e com os outros raros. Com todos os raros em cima do palco, em baixo na platéia, em cima do balcão.

Nem toda palavra é aquilo que o dicionário diz...

Por isso fico devendo a definição exata da sensação de uma noite que não foi apenas inesquecível.
Foi mágica.

Obs.: Sábado ainda teve Bienal do Livro, então foi um dia ainda perdida em encantos entre títulos, livros, livretos, magiaaa. Klécia no País das Maravilhas.

Final de semana para não esquecer.

Só enquanto eu respirar.

8 de outubro de 2009

Eu

Minhas complexidades,
Excentricidades.

Não digo se não acredito.
Não choro se não for triste.
Não defendo se não valer a pena.

Eu nunca seria uma boa atriz de cinema.
Nem de novela.
Talvez de teatro.
Porque às vezes faço teatro.
Às vezes fica na metade a vontade de dizer um todo.
De ser um todo.
Então nem sempre sou eu mesma,
uma vez que me permito ser metade de mim.
A gente usa máscara e acha que se esconde.
Pinta o rosto e pensa que ninguém vê.
[Será que alguém vê?]

Não sei não me preocupar,
Não sei não antecipadamente sofrer,
não sei largar a insegurança sobre minhas próprias capacidades.

Não sei sorrir para o que não me toca.
Não sei dizer que amo sem sentir.
Não sei sentir e não dizer.

Não sei não ficar boba olhando o mar.
Não sei subir uma montanha sem querer tocar o céu.
Desconheço a falta de vontade de ir além.
Eu quero sempre mais.
Quero o infinito.
E depois, e além.

Não gosto de formulações
Comparações
Premeditações.

Não gosto de frases feitas,
Mas ensaio minhas frases.

Falo sozinha. Falo comigo.
Gosto do escuro. Gosto do sozinha.
Gosto do silêncio.
O de fora e o de dentro.

Tenho medo de multidão.
Onde ninguém se vê, onde ninguém se toca.
Onde todos se tocam sem se tocar.
Onde parecem que querem melevar de mim.
Ninguém vê quem sou.

Não gosto do socialmente aceitável.
Do comportamento desejável.
Mas me descubro seguindo os padrões várias vezes.

Não gosto de livros de filosofia,
não gosto de televisão no domingo.

Gosto de passeio no campo, de bicicleta, a pé.
Gosto de pôr-do-sol, de mistura de cores.
Gosto de fotografia. Especialmente daquelas em que não sou eu na foto.
Não gosto de café.
Mas gosto de sentar pra tomar um café com os amigos
em dia de chuva.
Gosto de dias de chuva.
Gosto de bolo quente. E de casa de avó.
Gosto de inverno, de cobertor, de dentes tremendo.
E de abraço para esquentar.

Gosto de filme, gosto de companhia.
Gosto de pessoas felizes. Gosto de sorriso.
De gargalhada. De rir sem motivo.
De riso descontrolado.
Gosto de parecer pequena.
Menina pequena.
Querendo carinho, querendo colo, querendo proteção.

Gosto de vestido,
gosto de banho de chuva.
Gosto de dançar, sem parar.
Na frente do espelho, na frente de um monte de gente.

Não ligo de parecer meio louca às vezes.
Morro de medo de parecer uma louca inteira.

Gosto de pessoas profundas. De quem me faz pensar.
De quem me faz reanalisar.
Gosto de misturar as coisas.
Gosto de doce com salgado,
e de vento batendo no rosto.
Levando o que não for pra ficar.

Não gosto de esperar por qualquer coisa. Gosto de sentar e esperar coisa nenhuma.
Só sentar. E olhar. Gosto de olhar a vida.

Gosto de gente. Gosto de ver as milhares de partes diferentes aprendendo a conviver.
Gosto de contato. E do risco que ele traz.
Porque hoje já não me protejo tanto.
A minha casca é mais fina.
E assim eu mesma consigo me ver melhor.
E me mostrar melhor.
E gosto mais de mim do que gostava antes.

Gosto de ser como eu sou.
Sendo o verso e o inverso de algum poema
ainda por escrever.

7 de outubro de 2009

Silêncio

-Está ouvindo, flor?
-Não ouço nada, Amélie...
-Preste atenção, moça. Se ficar fazendo toda essa bagunça não vai mesmo ouvir nada.

...

-Continuo sem ouvir nada, Amélie.
-Flor, presta atenção... Enquanto não conseguires domar teus ouvidos para ouvir o barulho do silêncio, tampouco conseguirás ouvir o que diz tão baixinho teu coração...

Ecoutez le silence, ma chère.

4 de outubro de 2009

Apresentação

Chegou a hora de mostrá-la ao mundo.

Seu nome?

Amélie.

É um nome doce. Doce como ela.

Ela é uma menina ainda. Pelo menos parece uma menina. Mas não sei quantos anos ela já viveu. Sei que tem muitas histórias para contar. E suas histórias são sempre boas de se ouvir.

Amélie quer dizer cúmplice. E é bem o que ela é de mim. Amélie sabe bem mais de mim do que eu mesma.

Alguns dizem que Amélie é meu eu-lírico. Outros dizem que é minha amiga imaginária.
Outros tantos dizem que é meu sintoma mais clássico de esquizofrenia.

Eu não sei quem é Amélie. Não sei de onde veio, nem como chegou aqui.
Não sei quanto tempo vai demorar. Sei que ela gosta de chegar nos fins de tarde, ou nas manhãs bem cedo. E me canta canções. E pinta quadros. E são sempre paisagens, lugares que nunca vi. Parece que Amélie já viu o mundo.

Ela me dita poemas, e muitos deles eu copio aqui. Ela me sussura histórias engraçadas. É bom ouvir Amélie falar sobre qualquer coisa. Porque ela sabe das coisas.
Amélie tem uns olhos que mexem com a gente também. Gosto dos olhos de Amélie. Olhos de olhar a alma. Não consigo me esconder dos olhos de Amélie.
Amélie me faz companhia, e me aconselha. É como se ela soubesse de tudo no mundo. Mas ela não me conta tudo. Ela me mostra os segredos do mundo devagarinho.
Vou descobrindo aos poucos o que ela sempre soube.

Talvez Amélie seja o que eu gostaria de ser.

Por que ela tem tanto de mim, eu não sei.
Ela tem muito do que eu quero vir a ser também.

Ela se me mostra todos os dias. E começo meu dia com um sorriso e um bom dia. Que seja doce, ela me fala. Eu repito: Que seja doce o dia todo, todos os dias...

Esqueci de um detalhe importante: Amélie é francesa, assim como seu nome. Porque a parte mais doce de mim tinha mesmo que ser francesa.

Amélie talvez seja mesmo apenas parte de mim... Delírio do meu cérebro... Ausência de realidade.

Talvez...

Mas por mais delírio que possa ser, sei que é a voz dela que estou ouvindo agora, sonora e aguda, me ditando suavemente a mensagem do dia.

C'est doux, c'est beau. Bonjour.

Vazio

Ando com o vazio.
Vazio que não me larga mais.
Esse vazio, que de tão grande, toma conta
de mim, de ti, dos nós.

Por que ninguém me avisou
que vazio ocupava tanto espaço?
Se eu soubesse tinha separado
mais uns tantos de terreno no coração.

Esse vazio que é como um buraco fundo
que a gente não vê onde termina.
Descobri hoje que se sentir vazio
é o mesmo que se sentir cheio
cheio de uma coisa nenhuma.

(Só que ser cheio de vazio dói um tanto mais...)

Perder

Não gosto de perder...
Uma coisa na vida a qual ainda não consegui a me adaptar...
E que acontece tanto.
E que me dói tanto.

Não gosto de ver as folhas da minha árvore sendo levadas para longe.

Meu mundo fica mais sozinho.
E eu não sei ser sozinha.

--- Homenagem póstuma a uma quase amiga, que eu nem mesmo conhecia direito, mas que tenho (sim, não no passado) carinho.

Ficou a vontade de ter dito diferente, ter feito diferente. Ter sido mais doce.

Meu primeiro encontro com a morte. Não que não a tivesse visto antes. Tinha visto. Mas de longe. Dessa vez ela passou bem perto. Senti o frio gelado e a sensação do inevitável.
De não ter o que fazer.

Aquela dita que ninguém é insubstituível não cabe aqui. Nunca mais aquele tom de voz, nunca mais aquele jeito de tomar sorvete ou aquele jeito infantil de sorrir por qualquer bobagem.

Somente quando perdemos alguém para a eternidade é que sentimos o quanto podíamos ter feito mais. E fica aquela sensação de ausência misturada com a dor de nunca mais. Nunca mais parece longe demais.
E é aí que dói.

Foi hoje que percebi que, por mais que deixemos as pessoas com palavras doces, ou que digamos todos os dias o quanto as amamos, mesmo que tenha havido uma despedida, sempre ficará a sensação de algo mais.
Queríamos ter feito/dito/sorrido diferente. Queríamos mais um segundo. Mais um dia. Mais uma vida. Quando amamos, e temos a sensação de perder coisas do coração, é aí que choramos. Lágrimas por nunca mais.
As lágrimas dos que ficam são quase sempre vontade de um mais. Qualquer um mais.

Nunca seremos satisfeitos. A falta vai morar sempre dentro de nós.

Por isso resolvi hoje dar mais sorrisos. Ser mais doce.
Ser mais sol.

Quero, ao partir, deixar a necessidade de um algo mais em um tanto de gente.

É só assim que a gente vira eterno.
Morando pra sempre dentro de alguém.

3 de outubro de 2009

O Teatro Mágico

Uma emoção que não tem nem como definir...

Não é ansiedade, não é nervosismo...

Uma alegria cheia de entorpecimento...

Alguma coisa que palavras não conseguem descrever!

Ver O Teatro Mágico na semana da minha formatura foi o maior presente que eu poderia ganhar...

Então esse não é um texto poético, não é uma das minhas histórias ou Cartas Imaginárias...

É um texto de comemoração.

Comemorando a alegria de ver uma das mais lindas manifestações de arte com coração... "O Teatro Mágico torna possível que cada um se mostre como é, que cada verdade interna seja revelada. Essa é a grande brincadeira, "ser o que se é, afinal todos somos raros e temos que ter consciência disso". Palco e platéia se fundem e cada um dos presentes vai descobrindo a delícia de se permitir ser um pouco mais de si mesmo."



Simples Como Qualquer Palavra
O Teatro Mágico

Composição: Fernando Anitelli

Palavra, tenho que escolher a mais bonita
Para poder dizer coisas do coração
Dar a letra de quem lê
Toda palavra escrita ou rabiscada
No joelho, guardanapo ou chão
Ponto pula linha travessão
E a palavra vem
Pequena, querendo se esconder no silêncio
Querendo se fazer de oração
Baixinha como a altura da intenção e na insegurança
Vírgula, parênteses, exclamação
Ponto pula linha travessão
E a palavra vem ...

Vem sozinha
Que a minha frase invento pra te convencer
Vem sozinha ...
Se o texto é curto aumento pra te convencer
Palavra, simples como qualquer palavra
Como qualquer palavra...

Venho posteriormente descrever a emoção de viver a dor e a delícia de ser quem sou ao ver a mágica do Teatro Mágico...

2 de outubro de 2009

Sorria

Sorria, moça bonita!

O que no mundo poderia tirar este sorriso dos teus lábios?

Sorria pro mundo,
sorria para as estrelas,
sorria para o sol,
sorria para a lua!

Sorria,
que quando você sorri,
o mundo fica mais bonito...

O branco dos teus dentes dando paz ao coração...
A tua gargalhada barulhando dentro da gente
enchendo o mundo de alegria
por te ver feliz...

Sorria, moça bonita,
Sorria!

Que só por te ver sorrir
a gente já fica com vontade de ser feliz também...