11 de julho de 2009

Meu português

Eu estou cansada de conjugar meus verbos em futuro do pretérito. Sinceramente, acredito que não exista tempo verbal mais improlífico. Não quero mais pensar que eu amaria, viveria, faria, conseguiria. Quero descarregar minha vida dessas incertezas, hipóteses, irrealidades.
Aproveitando o ensejo, me livro logo também de todo o modo subjuntivo. Nada mais de se eu fizer, quando eu puder, ou que eu consiga. Vou preferir de agora em diante os verbos bem no presente. Bem no agora do indicativo.
De passado apenas os perfeitos. Bem completados. Vividos e acabados. Deixados para trás, mortos e enterrados. E o futuro deixo pra conjugar quando virar presente.
Ah, e nada mais de verbos defectivos, incompletos. Quero da vida todas as flexões, experimentar todas as possibilidades. Se for pra ser um verbo, que seja um anômalo, de radicais irregulares, nunca igual, nunca previsível. Que eu possa SER, sou, és, é, somos, sois, são.
Acabo também com a voz passiva dos meus dias. Meus sujeitos nunca mais serão pacientes. As f(r)ases de vida serão construídas sob a atividade da minha voz. Sem mais deixar meus sujeitos ocultos, ou com índices indeterminados, vou preferir colocá-los bem expostos, simples ou compostos; sujeito agente, experienciador.
Abdico ainda do particípio chato, sempre com os mesmos auxiliares, medíocre, que não consegue ser sozinho. Nada mais de tinha partido, tinha ficado, nada mais enxuto ou enxugado. Ou isso ou aquilo. Nada de verbos abundantes que querem dizer a mesma coisa.
Vou viver de gerundismos, existindo sempre numa progressão indefinida. Estar sempre caminhando, buscando, indo e voltando. Nunca parada, sempre conjugada.
Pra ser sincera, se eu pudesse escolher, seria infinitivo e só. Nada mais simples. Nada mais óbvio. Sem tempos, sem modos. Apenas um radical e seu tema. A vida como ela é. Sem alardes e enfeites. Sem renunciar às flexões necessárias a uma vida em sociedade. Mas fazer concessões pequenas, para que eu não me perca em mim mesma. Eu cantar, tu cantares. A essência fica preservada.
E pra viver bem meus dias, coloco muitos apostos entre minhas entrelinhas, pra que fique bem claro tudo que quero. Apostos dos mais variados. Aposto especificador, explicativo, numerador. E salpico de vocativos meus períodos mistos, repletos de coordenações e subordinações, porque afinal de contas, viver sozinha é muito chato.

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