E de pensamentos vou povoando a cinza das horas dessa existência. Os pensamentos que viram ações saem, os que morrem desejo, ficam.
Dessa forma, vou lentamente, vergonhosamente, me afundando nas areias da ampulheta de meus anseios, de meus pensamentos desvairados que não consigo externar, e vou me desmanchando a implorar clêmencia aos já sôfregos, que em nada podem me socorrer.
Vejo reflexos desbotados do que anda vagando pelo pântano dos meus adágios.
Analiso, reflito, nomeio, esquadreio. Avalio, rememoro, desnorteio, discordo. Reformulo, alucino, descompasso, desafino.
E são voltas e voltas sem sair do lugar. Mas continuo a pensar.
Penso, existo. Penso, enlouqueço.
Escrevo linhas desconhavadas, inutilmente presas a uma malha frouxa de conceitos que não duram mais que uma semana.
Escrevo linhas que ninguém lê. Ideários que valeriam uma revolução, ou ao menos um sentimento de misericórdia, e que não chegam a cumprir sua missão. Não cruzam a fronteira entre remetente e destinário.
Mas não existem destinatários. Não inicialmente. Não premeditamente.
Não que os escritos não devam ser lidos. Só não sei bem a quem direcioná-los.
Acho que, no fim de tudo, remeto os textos para mim mesmo. Envio pelo correio cartas que voltarão para minhas mãos.
Talvez para me lembrar das coisas em que acredito e nas quais preciso por hora acreditar.
Talvez para depois rir incontroladamente das tolices em que acreditei.
Escrevo para não esquecer de mim. Dos pedaços muitos que costuro na colcha de retalhos da vida. Escrevo para não esquecer dos muitos eus que me habitam. E que gritam para sair, desesperados querendo mostrar quem são.
Todos os eus donos do mundo meu. Todos os eus constantemente empenhados nessa tentativa de exposição.
Todos os meus eus - pensantes ou não (sim, tenho alguns eus não pensantes, e por esses tenho um carinho particular, seja por merecerem um cuidado especial, pobrezinhos, ou talvez por serem assim tão inconsequentes, capazes de realizar os desejos que meus outros eus se acovardam em tentar) - se unem inconformados perante essa dita.
Cogito, ergo sum.
Não é suficiente, meus caros, gritam os meus eus.
O que é o pensar? De onde vem o que se pensa e de que vale o adágio apenas pensado, não verbalizado?
Em que mudamos após um pensamento? O que fica e o que se vai?
Quais as metomorfoses que construímos? O que muda no mundo se o pensamento não sai, não contamina os outros eus, os outros tus, todos os eles?
Se não semeamos novas idéias, novas sementes, novas revoluções?
Se não discordamos todos os dias das nossas verdades, como evoluimos?
Que os teus eus também gritem: A única certeza é a dúvida.
Dubito, ergo cogito, ergo sum!
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