30 de novembro de 2009

Post it

"Se quer saber, sim, é saudade de você.
Todos os dias, várias vezes durante cada hora.
Ando a me pegar distraído, rindo sozinho.
Rio de ti, ou rio de mim?
Acho que rio dos dois. De nós dois.
Nós dois parece engraçado. Juntar EU + TU.

Ainda que meu excesso cético faça tudo parecer cômico e improvável, EU + TU é uma coisa que anda me fazendo andar à volta com risos bobos. Felicidade em doses homeopáticas.
E ainda tem essa saudade bem minha, bem tua, bem nossa.

É como dizem por aí, Do nosso amor, a gente é quem sabe..."

Medo meu

E o que vieste cá fazer, medo meu?
Deixa-me dormir, que amanhã acordo cedo... O dia é longo, e sempre haverão novas coisas a me assustar.
Não serás o único, não estaremos mais a sós.
Não será apenas a tua voz a me assombrar.
Então deixa-me dormir... Deixa-me sonhar...
Deixa-me ficar com o pouco de paz que me resta.
Com o tanto de vida que me cabe nesse burburinho.
Deixa-me dormir, medo meu.

A saudade, a frase perdida, um não, a dor...
A janela, a madrugada,
a partida, a chegada.
Amanhã o medo vai ter que cor?

Aniversário

-Sabe Amélie, é triste ficar velho.

-Sabe qual é a maior tristeza em ficar velho, pequena criança?
-Não, não sei.

-É passar da idade de poder chorar sem motivo, e levar a vida a ter que dar explicações lógicas a coisas que simplesmente não as têm, que apenas são o que são, indefiníveis.
É começar a juntar nossas emoções em ordem biográfica, cronológica, separando em dias, meses e anos o burburinho de sentimentos, como fotos num álbum de família.
É alcançar a idade de construir textos preocupado com métricas e rimas ricas para se dizer o que se sente, esquecendo os olhares e os colos onde podemos apenas nos recolher na hora que quisermos, sendo totalmente compreendidos em nossas angústias, anseios e amores.
É adquirir a capacidade de colecionar sentimentos inúteis, maquinações e premeditações, trocando nossa impulsividade infantil pelos medos, pelas táticas, pela racionalidade.
É aprender a viver histórias emprestadas, imitadas, vislubradas entre uma propaganda e um anúncio de TV.
É esquecer nossas verdades absolutas, nosso mundo tão pequeno e tão imenso por referências, análises e filosofias de outrem.
É parar de usar tão somente os pronomes pessoais do caso reto, se impondo os incômodos oblíquos.
É precisar de analgésicos e opióides para ser feliz na vida.

A bailarina

Ela tropeça os pés calçados com sapato de fita nos versos que espalha pelo chão. A bailarina já não ouve mais canção.
A sapatilha usada, gasta, estragada. A sapatilha que de tanto no mundo tão pouco viu, tão pouco sabe.
Os passos ensaiados em frente ao espelho, como quem quer alcançar a perfeição de si mirando no que há fora. A singeleza do gesto, a magia de cada rodopio.
Os passos no ritmo da bossa nova... A bossa embalando as voltas.
As quedas disfarçadas num passo de dança.
A bossa entoando a vida. A bossa nem mais tão nova...
As notas das canções, pintadas de azul. Azul cor de poesia.
Dó Ré Mi Fá[zendo] eco em mim,
Não estamos Sós,
Lá vamos nós outra vez...
Tentando refazer o que sobrou de si.

A bailarina procura certezas em meio às incoerências. Os passos desconcertados de uma valsa já batida, já marcada.
Ela senta no chão, esperando não se sabe o quê.
Ou ela espera história acontecer. Esperando a música soar, as notas vibrarem, ela espera os versos azuis.
A bailarina espera o dia de dançar.
Enquanto isso ela cuida de si.
Ela cuida das sapatilhas, minuciosamente, com gestos mínimos, sussurrados...
Enquanto entoa a valsa triste de quem espera um amanhã incerto.

"Astronauta, diz pra mim cade você, bailarina não consegue mais viver."

Alguém?

Quem um dia irá entender o seu destino?
E andar com os seus passos?
E um dia acordar olhando o seu rosto,
e dormir sob as mesmas estrelas?


Quando os dias não forem tão maus,
Quando os inexoráveis forem dissolvidos,
Quando se derem compreensões,
Quando formos o que podemos ser.


Quem irá lhe colher flores?

Quem lhe cantará canções?

O vento passando, o vento soprando,
trazendo e levando o que não é pra ficar.

Ela vai deixar a porta aberta
vai deixar a casa limpa
quem não tropeçar na soleira
sinta-se em casa,
entre e a faça feliz!

27 de novembro de 2009

Entre erros e acertos

Irremediável. Indecifrável.

Como ter a certeza do erro?
Como saber se o erro não nos é o certo?

Quem define o certo e o errado?
Se nem nós mesmos sabemos?
Nós nunca sabemos.

Como evitar os inevitáveis e por vezes necessários erros?
Qual o mal em errar, afinal?

Difícil reconhecer os erros. Mais difícil ainda assumi-los. Declarar a sua incapacidade. Sua falência. O quanto dói ter que voltar atrás no antes dito, no antes defendido.
Declarar-se ERRADO, e não CERTO.
Reconhecer-se errante. "Sempre na estrada, sempre distante..."

Difícil enxergar os próprios erros. Nossos CERTOS incontestáveis.
São seus erros que me mostram o quão certo eu estou. Muito mais fácil é julgar os erros alheios. Muito mais cômodo. Apontar os não certos enquanto camuflamos nossos próprios fracassos.

Mas o mais difícil, o quase impossível, é fazer com que as pessoas reconheçam que estamos CERTOS. Nossas cerdades absolutas. Irrefutáveis.
Nossos certos e errados baseados em nossas CERTAS certezas. Estamos certos porque alguém em algum lugar está errado. Aquele que nos contrapõe.
Para acertarmos alguém tem que errar. Tem sempre alguém errando em algum lugar enquanto estamos acertando.
Tem sempre alguém certo em algum lugar.

Mas quem vai dizer quem ganha no final?

26 de novembro de 2009

Janta

E eu
vou te servir o meu amor
numa bandeja de prata,
com todos os requintes de um prato principal.

Assim, onde não importam sobremesas e entradas.
Importa a vida, o gosto, a amarra.
O tempero de nossos desencontros.
O sabor das nossas massas.

Te darei minha paixão regada a vinho branco
numa taça transbordante de desatino,
perdida, achada.
Gosto de uva e desejo.
Descalibre do teu beijo.

E não me venhas morno, não me sirvas frio
Quero um prato quente,
com gosto de gente
onde não importam as idas,
as vindas, os ais e os senão.

Quero provar a vida
como quem bebe até não saber.
Mas não quero tudo de um só gole
Aos poucos, embriagar
assim, devagar,
até não ter mais o que fazer.

Ódio

Me odeias?
O que exatamente odeias?

O fato de descobrires que não sou o que imaginavas existir?
O fato das minhas imperfeições serem gritantes, latentes, prementes?

O fato da existir a culpa, a imprestável culpa?
A minha culpa?
Que digo minha, que tomo para mim?
Numa tentativa de quase assalto de bens alheios.

O que odeias em mim?
Diz-me, não sei adivinhar.
Certos jogos as crianças não aprenderam a jogar.

23 de novembro de 2009

Resta

[Ouvindo O Teatro Mágico - Não sou Chico mas quero tentar]

O que nos resta?

A mão cravejada de espinhos
das flores que tentamos roubar.

As calças rasgadas pelo vidro
das janelas que tentamos arrombar.

A boca seca, travada
das dores que tentamos sufocar.

A aquarela largada na sala
dos quadros que a gente não quis pintar.

As bocas virgens
dos beijos que nos negamos a dar.

Os olhos cegos
pelo que não quisemos enxergar.

A coragem morta
de quando desistimos de lutar.

O peito manchado de sangue
Das vezes que tentamos amar.


"As nossas condutas tão putas não valem a pena
Que pena, eh, que pena
As nossas condutas confusas nos tiram de cena, ah...
Que pena, eh, que pena

Vou, vou engarrafar essa dor,
Vou engarrafar a saudade
Vou me embreagar de tristeza
Bendizendo ela vira beleza,
Gentileza gera gentileza..."

Fôlego

Ela misturava livros, recados e guardados
com amores e dissabores, com cores,
com versos e flores.

Ela era mistério
a única certeza que nos resta na dúvida
uma certa imprecisão,
uma imprecisa certeza,
um receio, um sobressalto
um desalinho, um desaviso.

Sina nossa, sina minha.
Sina assassina.

Me lembre de manter distância.
Perto de você me falta algo importante,
como o ar ou algo similar.
Perto de você não consigo respirar.

22 de novembro de 2009

Amanhã

Quando você acha que nada de mais estranho pode acontecer no mundo
vem o mundo e fica maluco sozinho.
Alguém me diga o que esperar do amanhã.

"E a colombina só quer um amor
Que não encontra num braço qualquer
Essa menina não quer mais saber de mal-me-quer..."

20 de novembro de 2009

Imaginação che te fa bene!

Alô, alô, planeta marte chamando, planeta marte chamando...


Aqui é Lucas Silva e Silva, falando diretamente do Mundo da Lua, onde TUDO PODE ACONTECER...

Alô, alô, marciano... Se der, dá uma passadinha por aqui pra me pegar... A galera da Terra esqueceu como é brincar... Ficou muito chato olhar tanta gente chata que só faz brigar.

See you!

Ser feliz!

Citando Renato Russo: "Digam o que quiserem, o mal do século é a solidão!"

Não, não estou emocionalmente depressiva, nem depressivamente emocionada.
Estou pasma com a capacidade do ser humano de se esconder dentro de si mesmo - que outro lugar mais seguro se pode encontrar?

Máquinas da mais alta tecnologia desesperadas por felicidade. Máquinas burras - desculpem o termo - que não sabem onde encontrar essa dita cuja.

Sinto lhe informar, mas não, ela não vai cair no seu colo enquanto você fica em casa assistindo sua divertidíssima programação de TV.

Antes de tudo, aprendam a dar as mãos, aprendam a sentir, aprendam a dar e receber carinho. Aprendam a dizer "eu te amo" quando realmente sentirem. E sintam! Se permitam sentir!
Avisem às pessoas que importam para você o quanto elas lhe importam. Não deixem que elas se vão sem saber disso. Porque mais cedo ou mais tarde elas se vão.
Namore, se apaixone, case! Faça um jantar para quem você ama. Abrace. Sorria. Sem motivo. Não tenha motivos! Gargalhe. Conte piadas. Ria de piadas sem graça que seu amigo contou. Ou ria dele não saber contar piada nenhuma.
Quanto ridículo lhe parece a idéia de se mostrar necessitado de alguém? Então um conselho: é muito bom ser ridículo às vezes.

O mundo mudando, a tecnologia evoluindo... Estamos ficando cada vez mais velhos, viveremos mais que nossos pais, muito mais que nossos tataravós, e para que, se estamos ficando cada vez mais sozinhos? Muito mais anos de solidão e isolamento. Quanta diversão.
Ah, mas tem a minha carreira, minhas viagens, meus sonhos. Não tenho tempo, não tenho dinheiro.
Você não está tendo é vida.
Pegue seus amigos e saia por aí, passem uma tarde falando de todas as bobagens que puderem. Por um dia sejam vocês mesmos.

Como diz Annaldo Jabor: "Quem disse que ser adulto é ser ranzinza, um ditado tibetano diz que se um problema é grande demais, não pense nele e se ele é pequeno demais, pra quê pensar nele. Dá pra ser um homem de negócios e tomar iogurte com o dedo ou uma advogada de sucesso que adora rir de si mesma por ser estabanada; o que realmente não dá é continuarmos achando que viver é out, que o vento não pode desmanchar o nosso cabelo ou que eu não posso me aventurar a dizer pra alguém: "vamos ter bons e maus momentos e uma hora ou outra, um dos dois ou quem sabe os dois, vão querer pular fora, mas se eu não pedir que fique comigo tenho certeza de que vou me arrepender pelo resto da vida".

" Antes idiota que infeliz"


Quero que a felicidade beije minha boca sofregamente, me sacuda pelos braços todos os dias e me dê um sorisso maroto, me desejando bom dia!
Vou sair por aí, vou ser feliz!
Saia do pc, e faça isso você também!

19 de novembro de 2009

Foi-se












Fez-se céu.
A menina fez-se céu.
E foi-se embora num balão
voando pra longe
procurando ilusão.


Nuvem tem gosto de algodão.
Pó de estrela brilhando no chão.
A gente tinha esquecido como era doce sonhar.
Eu já tinha esquecido como era amar.

Fez-se céu.
Largou o chão.

Volta, visse?
Demora muito não.

Menina pintada de céu,
se um dia tu voltar
eu te entrego meu coração.

18 de novembro de 2009

Conquistas

Impossível dizer quando começamos. Talvez tenhamos começado nossa jornada no exato momento em que tivemos o primeiro sonho.
Mas ainda não percebíamos nada. Ainda era algo involuntário, algo inconsciente...

E por isso ainda intocável, imaturo, distante.

Mas sonhos buscados vão ficando mais perto. E sonhos sonhados juntos tornam-se mais bonitos.
E quanto mais perto as vemos - às nossas ambições, mais as queremos. Quanto mais próximo ao toque, mais necessidade.
Quando conseguimos ver sua forma, sua textura, a idealização passa a ter cores, tempos, verbalizações; então nossa ânsia aumenta por conseguirmos reconhecer nossa completa dependência.
Assinamos nossa rendição.
Nos declaramos sonhadores.
Que sabem exatamente onde querem chegar.
Que temem não chegar.
E por isso choram, e sofrem, e lutam. E buscam.
Sempre mais, cada vez mais longe.

Porque quando descobrimos o que queremos, o medo de não conseguir é a pior sensação do mundo.
E o prazer de consquistar é a melhor!

[Obrigada, meu Deus, por me dar forças de buscar meus sonhos, desde sempre, desde o primeiro; obrigada meus pais, por aguentarem meus medos e segurarem minha mão; obrigada meus amigos, por todos os "relaxe, você vai conseguir!"; obrigada Valter e Taci, pelos estudos, pelos telefonemas, pelos desesperos comunitários, por estarem comigo sempre e sempre, e por termos passado juntos, como começamos, só que mais unidos! Sem mais palavras. Só exclamações!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!]

Mestrado!!!

Contabilidade:

Ler quartorze capítulos do Abbas - 2 meses da minha vida e uma paixão por imunologia [alguma coisa você lucra...]
Aguentar Klécia explicando tradução gênica - uma tarde de agonia e a cara de desespero dos seus fiéis companheiros - a sua própria cara de desespero por saber que falou demais...
Aguentar Taci descrevendo os artigos de Saúde Pública - mais uma manhã de agonia
Aguentar Valter explicando genética reversa - desespero pré-entrevista.
Passar a ver Foucault em toda parte do mundo - alguns danos cerebrais irremediáveis
Ler mil e quinhentas vezes os capítulos do tratado de saúde coletiva - mais alguns danos cerebrais irremediáveis
Morrer de medo da nota de inglês, de prova específica e da entrevista - mais alguns buracos no estômago do trio com gastrite (estômago, mas que estômago???)

>>> Passar no mestrado com seus amigos, Não tem preço!!!!!!!!!

Parabéns pra nós!!!!!!!!!
[feliz de até perder a conta do quanto!!!]
Meus textos não vão caber de tantas exclamações!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

Pensamento clichê

Porque a beleza está nos olhos de quem vê. Clichês de linguagem falada, clichês de linguagem escrita, clichês de formas de viver. O clichê dos clichês.

Eu na verdade me acho bem clichê, e acho que por assumir isso mereço alguns pontos a menos com muitas pessoas.
Sou clichê porque não consigo ver forma mais bonita de terminar um dia que na beira da praia vendo o sol se pôr. Sou clichê por gostar de MPB, de rosas, abraços e de roda de amigos.
Sou clichê por gostar tanto dessas coisas já tantas vezes ditas, tantas vezes feitas... Sou clichê por gostar do trivial, do simplista.
Afinal as repetições viram clichês. E não imagino minha vida sem eles.

[Se eu um dia não mais ouvir um - eu te amo (afinal o que pode ser mais clichê? Qual o mais repetido, mais desgastado clichê?) eu realmente vou começar a achar que estou no mundo errado].

Acredito realmente que a questão não está no que se diz, mas na forma como é dito. Como as mesmas palavras podem tomar conotações totalmente díspares quando ditas por pessoas diferentes, em dias diferentes.
Porque o clichê da voz embargada de Chico Buarque acompanhada pelo mágica do piano de Jobim transformam a mais consagrada declaração de amor na mais nova forma de se amar.
Porque a voz clichê de Maria Rita, de Gilberto Gil e de Oswaldo Montenegro realmente podem fazer muito bem, mesmo quando repetidas initerruptamente, várias vezes por dia, vários dias por semana.


Salve os clichês!
São milênios de história. Milênios de formas de dizer, e re-dizer, e não dizer. Muitas coisas já foram ditas, não ditas, e deixadas por ditas. Como saber se o que você fala não já foi dito há alguns minutos atrás?

Se alguém quiser inventar uma forma nova de cantar a vida boêmia, de perder a noção da hora, de travessuras em noites eternas, tente uma não dita por Jobim+Chico Buarque.
Tente ser um amante a moda antiga e não se ver refletindo Roberto Carlos.
Tente ser um apaixonado não romântico, tente ser romântico e não ficar louco desvairado, tente ser um poeta que não fala de amor, tente ser um político que não faça promessas.
Tente não ser clichê.
Tente não ser padrão.
Seja o que for, seja original
.

[Que fique bem claro que não defendo as cópias, os plágios e as re-edições. O que defendo aqui é que as frases que todos defendem como desgastadas, assim o são porque realmente causam algum impacto em quem as ouve, por isso se tornaram clichês]


Por isso que sem você o mundo é só sofrimento, e continuamos abrindo com chave de ouro nossas frases de impacto. E antes de mais nada, é importante aparar as arestas que ficam nessa discussão. E vamos a todo vapor, a toque de caixa, fazendo uma atuação impecável. Porque a voz rouca das ruas sempre fala mais alto, e bater de frente quanto à onipresença de clichês nunca vai nos levar a um denominador comum.
Enquanto o mundo se desdobra em calorosos aplausos, carreiras meteóricas, em melhores bandas dos últimos tempos da última semana, vamos vivendo nossa vidinha de sempre, nossa vidinha mais ou menos, brincando com a caixinha de surpresas, trocando figurinhas. Porque figura repetida não completa albúm. Não mesmo.
Via de regra
, dia após dia é a comédia da vida real, a vida como ela é. Com direito a congestionamentos monstruosos e consequências imprevisíveis. Vamos correndo por fora, tentando conseguir nosso lugar ao sol. Dispensamos apresentações. Nos queremos desconhecidos mesmo. Assim evitamos as duras críticas. Mas não as escoriações generalizadas. Não as penas que sentimos de nós mesmos.
Vamos fazendo por merecer. Nossa fonte inesgotável de cópias e reformulações. Gerando polêmica. Acabando em pizza. Nos inserindo no contexto! Procurando a luz do fim do túnel. Que túnel? Onde está esse bendito túnel? A pergunta que não quer calar... Não consigo ver, está escuro demais para eu achar...
Quantas lacunas ainda a preencher? Vamos quebrar o protocolo, não temos tempo a perder. Antes que percamos tudo, cheguemos ao fundo do poço, mediante danos irreparáveis. A família estará inconsolável. Teremos nos destruído com requintes de crueldade. E enfim respiraremos aliviados, por termos cruzado a linha de chegada. Masoquistas que somos. Kamicases, voando em rota de colisão.
Seremos traídos pela emoção. Visivelmente emocionados, teremos conseguido os louros da vitória inglória. Os quatro cantos do mundo, do Oiapoque ao Chuí, terão assistido nosso caminho retrilhado. Tantas vezes trilhado. Tantas vezes refeito. E ainda inexplorado.
E que ruído ensudercedor é esse que escutaremos? Uma sonora vaia da platéia da humanidade? Por termos sido apenas o que todos foram? Termos dito o já tantas vezes dito?
Termos sido o que já foram?

Quem nunca usou um clichê atire a primeira pedra.
Enquanto isso, eu fico aqui dizendo eu te amo & cia LTDA.

16 de novembro de 2009

Beijo

Um beijo.

O primeiro beijo
Tímido, de bocas desconhecidas procurando dançar sem pisar os pés.

Beijo de bocas, e de mãos que passam, que tocam, que reconhecem que apertam, e comprimem.

Mãos e costas que se unem
que se sentem
que se apresentam
desconhecidos um do outro que ainda são.

Iniciativa desesperada de reconhecimento de território nunca dantes visitado.

O beijo destruindo o fôlego, destruindo as palavras, destruindo as divagações.

Teu beijo não sabe perguntar.
Ele apenas explica.

A pequena história de como te esqueci

Vivi com você por anos.
Fiquei te escutando por anos.
Anos te vendo dormir
anos te vendo acordar.

Por anos tentei te entender
foram anos tentando
te sorver
te beber
te provar.

Te enlouquecer.

Anos tentando ter você
absorver você
reconhecer você
anos ouvindo o eco da minha voz
Anos de não saber

Como entrar em você.

Como quem chega em casa e
sem precisar ligar a luz
consegue encontrar cada minúncia
do que é seu,
tentei saber você.

Tentei sentir você
[tuas gélidas e insensíveis mãos]
Teu gélido e insensível tu.
Te vasculhei
Te esquadrinhei.

Anos tentando simplificar você
Simplificar nós dois.
Irracionalizar.


E quando eu fui embora,
não precisei de mais que
um segundo
para entender tudo.

Eu tinha deixado de te amar.
Mas já faziam anos.

15 de novembro de 2009

Estrelinhas


Porque sempre que anoitece,
e me falta coragem...

Eu olho pro céu
e conto as estrelas.



Para cada vitória que eu tiver na vida, pendurarei no céu uma estrelinha novinha em folha.
Colada assim mesmo, com papel celofane e cola bastão.
Vou encher o céu de sonhos.
E um dia terei minha própria constelação.

Se se morre

De que morte se vive?
Que tipo de vida mata?

Se morre quando se quase vive. A vida vivida ao lado da morte de cada dia. A morte nossa que nos mata em vida.
E se vive enquanto a chama não apaga. Se vive? Se morre? Se mata?


Seria o último suspiro o fim da existência? O ponto final da agonia. A pausa no relógio do tempo.
Mas os ponteiros não param. As horas se arrastam. Te arrastam. E te levam. Te acabam.

E o que te resta? Você desiste, se entrega, e continua o caminho meio morto, semi-vivo, respirando o pouco ar que te sobra no esquadrinho da tua quase vida.

Quando a morte chega? Quando eu a chamo ou quando ela me leva?

É triste a morte dentro da vida. É triste ver os cadáveres que andam em meio a nós. Embrulhados em faixas, expelindo os odores da putrefação.
Lembrando o pó de que somos feitos. O triste fim de cada um.

Mortos que não esperam ressurreição. Nem remissão. Nem compaixão.
Mortos por opção.

Quando te rendestes, vida?
Vida? Que vida?
Se se morre?
Se me matas?

Vida ingrata. Vida vazia.
O que te resta?

Outra chance.
Quem sabe outro dia. Outra vida. Outra morte.

Quem sabe a gente recomece.
Quem sabe de uma outra forma.
A vida consiga ser vida
Numa outra realidade
menos morta.

Causas Perdidas

Não sou boa em desistir. Sou daqueles que acreditam até o fim, contra todas as possibilidades. Quando tudo parece perdido.

Não sou boa em largar os meus sonhos fora. Não meus ideais. Minhas utopias.


"Nem por você nem por ninguém eu me desfaço dos meus planos... Quero saber bem mais que os meus vinte e poucos anos..."


Mas por vezes a luta é silenciosa. Por vezes só nós mesmos sabemos que ainda travamos nossas batalhas. Por vezes nossas armas de guerra são a lâmina fria das nossas lágrimas, o escudo protetor de um sorriso que mostramos ao mundo.

Muitas vezes o silêncio é nossa estratégia. Silenciamos. E passamos despercebidos por quase todos, e é aí que nos tornamos mais perigosos. O efeito surpresa.

Independente das probabilidades que delimitam causas perdidas de causas vitoriosas, luto todas as minhas guerras com a alma inteira, porque entre vitórias e derrotas está o caminho que vamos trilhando. E que sempre vale a pena.

14 de novembro de 2009

Embriguez

Há que se embriagar para bem viver.

Há que se tornar ébrio dia após dia, logo bem cedo de cada manhã, para suportar os passos que ficam cada vez mais ásperos, mais duros.

Há que se entorpecer o cérebro para evitar as dores da vida. Para suportar as injustiças. E as justiças por algumas vezes.

E nesse ponto fico feliz em ser mulher, uma vez que a lenda reza nossa menor resistência à embriaguez. E lamento copiosamente a pena dos tolerantes, dos resistentes, dos imunes... Como lhes deve ser dura a vida nua a crua... A vida que nos arrasta para baixo, nos derruba no chão, caindo sobre nossos ombros como o peso da gravidade sobre a matéria.

Há que se embriagar com o vinho que mais te aprouver: poesia, sonhos, amor. Não importa o combustível. Detêm-te no resultado final de teu intento. Dessa forma, sorve tua taça por inteiro, sofregamente, insaciavelmente.

Desenvolvamos a capacidade de viver os dias entorpecidos nas verdades que criamos para evitar danos a nós mesmos. Sejamos bravos o suficiente para assumirmos nossa covardia. Nossa fuga. Nosso esconderijo. Sejamos bêbados, trôpegos, aspirantes de uma vida que nos quer ser tirada pela aspereza dos dias. Sejamos humanos. Sejamos o que somos. Libertemo-nos. Embriaguemo-nos para que o mundo veja nossa verdade, se quando sóbrios nos acovardamos e nos reprimimos, viramos escravos do tempo, da matéria, de nós.

Aprendam essa pequena lição. E me dêem minha taça de poesia cheia até transbordar, que hoje o dia amanheceu cinzento demais...

Mudanças no Blog

Um pequeno comunicado aos parcos leitores que ainda me restam (aqueles que por algum motivo ainda não foram espantados pela chuva, pelos ventos e pela pouca qualidade literária dessa aprendiz de escritor):


Tempo de mudanças no Blog.

Aos mais atentos, venho destacar que um marcador foi excluído. "Boas Idéias", lugar onde eu postava textos de outros autores, com os devidos créditos, foi "transportado". Agora eles serão todos postados no meu outro Blog - Entre.aspas, e aqui ficarão apenas os textos de minha autoria.

Assim, se vocês quiserem ver a literatura de qualidade, entrem no Entre.aspas, e os que por algum motivo ainda resistem aos redemoinhos da minha suposta inspiração, leiam o Entrelinhas.

E fica assim tudo bem dividido, cada coisa em seu lugar!

13 de novembro de 2009

Bankroll


A vida como num jogo de poker.


Para conseguir o que você quer você tem que pagar o preço. Risco para o benefício. As melhores cartas que se pode ter.

Poker é habilidade, não azar. Poker é entender o que as apostas querem dizer. Quem tem mais a ganhar quase sempre é quem tem menos a perder.




Ele não entende as regras.

Ele não gosta de perder.

Não sabe jogar.

Não quer apostar.

Ele quer ser o dono da banca.

Controlar o baralho.

Dar as cartas.



Flup, Turn, River.

Royal flush.

Sorte de principiante?!?

Ele não sabe jogar.
E mesmo assim SEMPRE consegue me ganhar.

Eu acho...

-Sabe o que eu acho, Amélie?
-O quê?
-Que eu me apaixonei por ele... Porque ele é assim o cara mais legal do mundo, e quando ele ri me dá vontade de rir também, e eu ficaria ouvindo as histórias dele a noite toda, e quando ele fica com raiva de mim me dá vontade de chorar. Ah, e tipo, ele é o cara mais inteligente que eu conheci na vida também, e nem se esforça tanto assim pra isso.
-Oh, Deus. E agora?
-Agora? A gente senta e espera que passe. Esse negócio de realizar impossíveis é um pouco demais pra mim.

=D

Peso

Carrego hoje o peso da lua
e de uma paixão mal curada.
Eu ia passar o dia costurando nuvem
Mas acordei, nem levantei nem nada.

11 de novembro de 2009

Nossa peça

E o que nós estamos fazendo aqui, afinal?
Quem apagou a luz do cenário teatral?




Liguem os refletores, rufem os tambores,
Comece a comédia da vida real!

Vida de superfície.
De que valem os interiores? Dá muito trabalho parar e olhar.
Ninguém demora mais que dois minutos.
Pra que o tempo, pra que a demora, pra que ficar?

O que de bom você tem aí pra me dar?
Fala logo, tô com pressa, não dá pra esperar...
Se demorar, a fila anda, não vou ficar.
Não vou ficar.


Ou melhor, só dá pra ficar.
Não dá pra sonhar, não dá pra amar.
Eu quero sentir. Agora, já!
Que me importam os que vêm por aí?
Nesse instante, pra cá!
Eu não quero demorar.


Vida banal. Vida banida.
Condenada à cadeia do Eu
Eu posso, eu faço, eu quero
eu sou!
E de que valem os nós?
Desfaçam os nós.


Dêem espaços aos Eus.
Eus viciados, drogados, condenados
fumando solidão aos maços e maços.
Vida tragada aos maços.
Amassos.


E o que se fizeram dos seus?
Quem ficou com os meus?
Quem ensinou esse jeito novo
de se não se apegar?
A gente nem viu a hora passar...
Impessoou a vida.
A gente desistiu de sonhar.
Que prazer você pode me dar?


Agora não dá.
Vou te ensinar.
Deixa pra lá.
Quem sabe outro dia, outra hora,
qual a diferença que isso faz?
Mais cedo, mais tarde,
Tanto faz, tanto faz.


E a gente vai vivendo a vida
cada dia mais perdido
no meio da multidão
de atores contratados,
mal remunerados
classe operária da dissimulação.


A gente esqueceu como é viver
a gente veio olhar o palco se acender
Assistir a vida de camarote
A gente fecha os olhos nas cenas mais fortes.
Finge que não vê, finge que não vê.


A gente veio ao mundo a passeio.
Se complicar, ano que vem
as férias são em outro lugar.
A gente aprende fácil.
O que o dinheiro não pode comprar?


E sou eu no centro do palco?
Rosto pintado de branco,
nariz redondo vermelho.
Fazendo rir quem assiste
a peça do mundo inteiro?

Só porque não sei brincar
desse jeito novo de se relacionar?

Qual a graça dessa peça?
Não há! Não há!

10 de novembro de 2009

Ela, noves fora, nada.

Meu bom amigo,


O que mais te assusta?


O sorriso fácil, o vestido claro,
ou os olhos, ou as histórias
ou seria alguma coisa na forma com que ela fica nervosa
sempre que você implica com ela?



O sol iluminando os cabelos claros?
ou a mulher menina que você não entende?
aquela tristeza nos olhos de quem mente
uma dor com um sorriso em cada mão?



Te assusta a independência, ou a irreverência
o não precisar, não depender, misturado
àquela forma tão necessitada de viver
e de cantar e de amar e ser feliz?


O jeito que ela sai de si
e cura o mal, e te faz sorrir
e transforma brisa leve em tempestade
e dia sem graça em novidade?


Assusta chegar perto, ou assusta ficar longe?
A falta de contato, ou medo da solidão?
A angústia de ir embora
ou o medo de ficar?


Ela te assusta. Inteira e por completo.

Ela, noves fora, nada.

O que te sobra é menor do que o que te falta.

9 de novembro de 2009

Par perfeito

A primeira crônica do blog!!!!
^^


Mais cedo ou mais tarde, conversa de gente solteira dá na pergunta: e tem alguém perfeito???

A relativa aparência de felicidade plena e completa dos casaizinhos por aí acabam fazendo a gente esquecer dos pequenos altos e baixos de qualquer relação. Porque não adianta. Não dá pra sorrir 365 dias por ano. Temos que contar sempre com as finais de Campeonato Estadual, aniversário de sogra e semana de TPM. Sim, haverão constrangimentos, e alguns desentendimentos que os casais mais educados chamarão de "discutir a relação", e os mais nervosinhos resumirão a agressão física e verbal pura e simples.
O fato é que a humanidade vive atrás da bendita perfeição. O cara com o sorriso perfeito, com o cabelo perfeito, os dentes no lugar, com o jeito atraente, que se vista bem, use aquele perfume que você adora, que tenha uma conversa bonitinha, que goste das coisas legais que você quer fazer, ou como diz uma amiga minha, "o cara que tenha a pegada"... Deixe-me ser grossa: Não vai achar, meu bem... Pelo menos não alguém que junte isso tudo aí. A matemática é clara. Já tem muito mais mulher que homem no mundo. Agora pare e pense: quantas mulheres bonitas você conhece? E quantos homens a-la Brad Pitt? É fato. A genética não é tão aleatória assim. Existem padrões que definitivamente não são herdados de forma randômica.

Acredito que o problema está na nossa concepção de perfeito. Ficamos procurando o padrão geral de perfeição, o que o mundo rotulou de bonitinho, ou ainda criamos nossa própria visão idealizada, e passamos a vida procurando por isso, como se andássemos na prateleira do supermercado procurando o produto que vimos no comercial da TV.

Não vim aqui defender que não existem pares perfeitos. Acredito que existam sim, e até conheço alguns para provar. O que venho defender é que perfeito não é o que cai no colo, é o que a gente constrói. Aos poucos. Pode ser uma coisa de um momento, ou alguma coisa de uma vida inteira. Perfeito é aquilo que nos faz bem, e a gente nem sabe porque. E começa a precisar daquilo como num vício, como num jogo. Perfeito não é porque não tem defeitos. Perfeito é porque é aquilo que a gente precisa. Precisa ali, naquele momento, naquela hora. Se for pro resto da vida a gente descobre depois.


O amor da sua vida não vai ser impecável. Nem você seria mais feliz com o galã da novela das nove.

O amor da sua vida vai ser algo complicado, atordoante, confuso, nada fácil, alguma coisa que te faça querer virar do avesso. Isso definitivamente não consta no dicionário como definição de perfeição. Mas é exatamente toda esta confusão que corresponde a melhor sensação que você pode ter na vida, e isso sim é perfeito. Você não encontra alguém igual a você e é feliz. Você encontra alguma coisa que encaixa com você, e é feliz. Não é pra ser igual. É pra ser complementar.

Tá bom, tem que aparar umas arestas quase sempre. E fica uns espaços sobrando, outros faltando. E isso assusta. A compatibilidade do incompatível amedronta de verdade. E muita gente boa não aguenta o tranco. E volta a procurar por aí o par perfeito que na verdade vai ser tão imperfeito quanto todos os outros.

A diferença é que tem alguém que chega bem perto do que é perfeito pra você. E vale a pena ter isso do seu lado, nem que seja por um dia, ou por uma vida.

E depois???

E depois
Que você escalar a última montanha,
Vencer o maior medo,
Conquistar o melhor prêmio,
depois de ganhar o mundo...



O que virá depois?
Qual a próxima coisa que você vai querer?


[acho que já vai estar bem longe daqui para perguntar a mim]

8 de novembro de 2009

Tomara

Tomara que eu amanheça
teus olhos até o fim da vida.
Como o sol a me queimar a pele
seja teu sorriso a me cegar a vista.


Tomara que eu anoiteça
com teus beijos, teus desejos,
tuas angústias sem porque.
E que seja meu batom a caneta
com que me escrevo em você.


Tomara, meu Deus, tomara...
Que sejas meu durante o ano inteiro.
Entre janeiros, carnavais, maracatus, bacamarteiros,
luzes e fogueiras de São João.
E que todos os anos de toda uma vida
Se sucedam na mesma repetição.


Tomara, meu amor, tomara...
Que tudo que nos separa
não seja mais que fogo de palha,
não seja mais que dissimulação.


Tomara, meu bem, tomara...
Que no fim do dia você chegue
me dê um beijo na cara
Me abrace com força
e cale esta boca
que não tem o que fazer
Enquanto você não chega, enquanto você tarda.


Tomara, meu Deus, tomara.

7 de novembro de 2009

Deixa soprar...

"E como será? O vento vai dizer lento o que virá, e se chover demais, a gente vai saber, claro de um trovão, se alguém depois sorrir em paz.
Só de encontrar..."


Vento no rosto
Tocando na pele
Carinho de leve...

Vento no cabelo
Vento nos pensamentos.
cabelo nos olhos, na boca,
no nariz, nas idéias.

Embaraçado de cabelos.
Trançados, complicados, confundidos.
Revoltados, embaralhados, misturados.
Livres. Presos no moinho de vento.


Cabelos ao vento
Vento nos cabelos.

E essa vontade de não ir embora nunca mais.


"Parece até que o vento traz o sentimento...
Pro vento que traz sofrimento
Que sopre pra outro lugar!
Pro vento que traz amor
Não vejo a hora de você chegar."

Pequeno ensaio sobre a solidão

Era uma tarde de novembro.

Só por ser novembro já ficava tudo triste. Ela não conseguia achar nenhum mês que parecesse mais triste. Ou talvez fosse apenas a tristeza dela que deixava o mundo lá fora meio macambúzio. Engraçado que quando ela ficava triste sempre chovia. Chovia por que ela estava triste, ou ela estava triste por que chovia? Ela realmente não sabia dizer.

Ela foi até a praça do Diário, um lugar bonito para pensar, pra escrever. Para ver a cidade, sentir as pessoas. Sentou, esperou, e nada aconteceu.
Foi até o cinema, e nada.
Saiu para uma volta de carro, e só o nada andando ao lado dela, tomando um café no fim de tarde e comentando sobre o livro escolhido às pressas na livraria.

Ela caminhando no calçadão no fim de tarde pela Avenida Boa Viagem; correndo até, virando meio mundo... e nada, absolutamente nada parecia se mover.
Nada saia do lugar. A perfeita imutalidade do universo que assombra aqueles que esperam apenas a hora em que algo acontece [ou deveria acontecer].

E por tanto esperar esse tempo que nunca passa, essa hora que nunca chega, esse sorriso que nunca lhe sorria, por estar sempre sozinha, sendo seguida de perto por esse nada insistente, ela, por essência uma criatura que não conseguia ficar calada, acabou ficando amiga do nada.
E foi esse mesmo nada quem os aprensentou. Ficaram amigos. Ela e a solidão.

A solidão sempre a assustou, então no começo foi difícil. Elas não confiavam muito uma na outra. Havia um quê de assustador naquilo tudo. Mas elas foram se conhecendo melhor, e agora já não tinham mais medo uma da outra. A solidão pode ser doce, às vezes. E sincera quase sempre. Uma boa companhia para horinhas de descuido. E ficaram boas amigas. E trocaram figurinhas, e assistiram novela, e comeram brigadeiro de panela enquanto viam filme locado no fim de semana. E assim foram alguns dias se passando.

Mas, apesar de tudo, uma certeza ela tinha: não ia querer andar com a solidão para sempre. Um negócio meio previsível, mais cedo ou mais tarde elas iam enjoar da cara uma da outra. Hora ou outra ela ia fazer as malas e partir. Pra longe da solidão, do nada e de todo o resto.

Mas por enquanto, ali era tudo que ela precisava ter. Um pouco de si mesma para variar.

Sou feita de quê?


“Inteligência é aquilo que fazemos quando não sabemos o que fazer” [John Holt]



Se tenho uma coisa para fazer e não faço,
Se eu tenho uma idéia e não passo adiante,
Um plano mirabolante que não executo,
Um sonho que não corro atrás,
Tudo isso por livre arbítrio, vontade própria, decisão voluntariamente construída...


Isso faz de mim uma irresponsável ou uma criminosa?


Alguém que desiste fácil, desatento, desleixado
ou um alguém se usurpando de si mesmo?

Tirando de si o direito de ser o que é?

Se tenho milhões de facetas, por que mostrar apenas a mais facilmente aceitável?
A mais facilmente elogiável? Reconhecível?

O que faço com as mais escuras, as mais deturpadas, as mais sombrias, as mais deslocadas, nem tão virtuosas?

Varro tudo de mim que não mereceria aplausos para debaixo do tapete felpudo da sala. E torço para ninguém tropeçar nele. Não levantar a poeira de desejos mal acabados.

Minha consciência está me dando gritos por isso. Alguém a mande calar a boca, ou me convença a começar a ensinar certos dragões a nadar.

5 de novembro de 2009

A flor

Será que a flor,
em meio a todas as suas preocupações de ser flor,
ser perfume, ser essência,
ser pétala e ser cor,
enquanto se esvaem os dias
e secam as folhas,
a flor percebe-se flor?

E por não saber-se flor,
e por não conhecer-se assim,
ela é menos flor por não dar conta do que é enfim?